A qualidade do sono é comumente associada com uma série de condições de saúde – como diabetes, obesidade e outras – e agora pesquisadores americanos começaram a estabelecer uma relação também entre o que comemos com as horas que dormimos. A observação foi feita em um estudo, publicado pela revista internacional Appetite, que associa a quantidade de nutrientes ingeridos em dietas diárias com a quantidade de horas dormidas. A conclusão dos pesquisadores das universidades da Pennsylvania e de Chicago, nos Estados Unidos, foi de que quem dorme a quantidade de horas recomendada por dia – entre 8 e 9 – mantém dietas com maior variedade de alimentos.
O estudo foi feito com base em dados da National Health and Nutrition Examination Survey (pesquisa que coleta informações nutricionais e de saúde dos cidadãos norte-americanos) e constatou relações entre a duração do sono com a presença em excesso ou a deficiência de categorias de nutrientes.
No caso das pessoas que dormiam por menos de 5 horas diárias – o que é considerado pouco – os pesquisadores perceberam pouca ingestão de água, vitamina C e selênio (encontrado em grãos, frutos do mar e carne bovina e de aves), mas grande ingestão de vegetais.
Já em quem dorme demais – mais de 9 horas diárias – foram frequentemente observadas dietas com mais carboidratos e álcool e menos colina (nutriente encontrado em ovos, cereais integrais, vitela e fígado de aves), teobromina (composto presente no chocolate) e ácido dodecanóico (encontrado em óleo de coco).
Para o nutricionista e professor de bioquímica da faculdade Gama Filho, Alexandre Aguiar, não só a alimentação é importante para a manutenção da qualidade do sono como uma boa noite de sono também ajuda a manter o organismo funcionando bem. “Nós nos preocupamos porque o sono pode ser bom e reparador. Quando de qualidade, ele consegue fazer o corpo queimar gordura e ganhar massa muscular, então ele é um grande aliado da dieta”, pontua.
Aguiar explica que o sono é regulado pelo hormônio melatonina, que é produzido pelo corpo durante a noite. “Porém alguns alimentos podem ter componentes químicos capazes de estimular a produção dela. O aminoácido triptofano é um deles e está presente no chocolate e em derivados do leite”, afirma. As vitaminas B6 (encontrada na banana) e B9 (encontrada em verduras folhosas verde escuro) também auxiliam na produção do hormônio. Segundo ele, esses nutrientes são convertidos em serotonina, que à noite se transforma em melatonina.
O bom funcionamento do intestino também é um aliado para o sono de qualidade. “Uma pessoa com mau funcionamento pode ter insônia, uma vez que quando a modulação intestinal vai bem a produção de serotonina aumenta. Por isso alimentos integrais também são importantes para a dieta e para o sono”.
Apesar da constatação, os autores da pesquisa afirmam que ainda serão necessários estudos futuros para explicar se as associações entre a dieta e a qualidade do sono são decorrentes de disfunções de apetite ou se os nutrientes dos alimentos têm efeitos psicológicos na regulação do sono.
No Brasil, especialistas têm dificuldade em confirmar a associação. A reportagem do Saúde Plena procurou a Escola de Nutrição da UFMG e da PUC Minas, mas nenhum professor dos cursos se sentiu à vontade para falar sobre os impactos da alimentação no sono.
De acordo com a nutricionista Heloísa Gambarelli, pesquisas que façam essa relação são escassas no Brasil. O que é comumente difundido na categoria são os efeitos de alguns tipos de alimentos no sono. “O que sabemos é que comer alguns tipos de alimentos próximo ao horário de dormir pode gerar desconforto. Comidas gordurosas e apimentadas tem esse impacto, por isso recomendamos que as pessoas prefiram comer comidas leves e calmantes como verdura e chás, uma ou duas horas antes de ir dormir”, afirma.
Entre estudiosos do sono a relação também é pouco conhecida. O presidente da Fundação Nacional do Sono, o médico psiquiatra com especialização em distúrbios do sono Dirceu Valladares, afirma que é mais comum encontrar estudos que mostram como o sono altera a alimentação e não o contrário. “Alguns estudos dizem que pessoas que dormem mal, com sono fragmentado, tendem a ingerir mais carboidratos e comidas rápidas, de alto poder calórico. Essa tendência é, inclusive, comprovada clinicamente”, explica.
Segundo ele, quando o corpo não tem um sono de qualidade, ele demanda energia que possa ser gasta de maneira mais rápida. Outra tendência observada é a de pessoas com sono interrompido desenvolverem instabilidade na produção de insulina. “Percebemos que o bom funcionamento do sistema endocrinológico depende muito de um sono adequado. Quando isso não acontece muitas pessoas desenvolvem até diabetes”
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